A Justiça do Rio de Janeiro decidiu manter a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro por declarações ofensivas dirigidas à cantora Preta Gil durante sua participação no programa CQC em 2011. O episódio, que gerou grande repercussão à época, continua sendo um marco importante nas discussões sobre racismo, homofobia e discurso de ódio na política brasileira.
A decisão, mantida pelo Tribunal de Justiça, reforça o entendimento de que figuras públicas precisam responder legalmente por suas falas, especialmente quando ultrapassam os limites da liberdade de expressão e ferem a dignidade de grupos historicamente marginalizados.
A pergunta de Preta Gil e a resposta que chocou o Brasil
Durante sua participação no extinto CQC (Custe o Que Custar), Preta Gil fez uma pergunta direta a Bolsonaro, que na época era deputado federal. Ela quis saber como ele reagiria se um dos seus filhos se relacionasse com uma pessoa negra. A resposta de Bolsonaro causou indignação: ele afirmou que isso não aconteceria porque seus filhos foram “bem educados”, associando o relacionamento a uma ideia de “promiscuidade”.
A fala foi imediatamente classificada como racista e homofóbica por diversos setores da sociedade. Políticos como Jean Wyllys e Maria do Rosário denunciaram a postura do então parlamentar. A OAB também se posicionou contra o episódio e encaminhou um pedido de cassação, enquanto o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro aplicou uma multa por dano moral coletivo.
Reação de Preta Gil: coragem e enfrentamento
Preta Gil não ficou calada diante da ofensa. Com coragem e firmeza, anunciou publicamente que tomaria medidas legais contra Bolsonaro. Ela reafirmou que não se deixaria intimidar pelos ataques que sofria nas redes sociais e fez questão de destacar a importância da representatividade. “É preciso dar a cara a tapa”, disse, assumindo seu papel como figura pública que enfrenta o preconceito de frente.
Ao longo dos anos, Preta passou a se posicionar ainda mais contra o conservadorismo crescente no país, tornando-se uma voz ativa contra o bolsonarismo. Ela se aliou a movimentos LGBTQIA+ e à militância negra, consolidando sua atuação política e social como artista engajada.
Intolerância política e ativismo social
Mesmo sendo alvo frequente de críticas por seu corpo, identidade e posicionamentos, Preta Gil seguiu firme. Em 2017, no Dia Internacional de Luta Contra a Homofobia, ela publicou uma mensagem poderosa em suas redes sociais. No texto, comparou o racismo, a intolerância religiosa e a homofobia como expressões de um mesmo ódio estrutural. “Somos todos iguais em nossas diferenças”, escreveu, incentivando seus seguidores a combaterem o preconceito em todas as formas.
Enfrentando haters com autenticidade
Nas redes sociais e nos palcos, Preta sempre lidou com haters de maneira autêntica. No programa Simples Assim, exibido em 2020 pela TV Globo, ela falou abertamente sobre os ataques que sofreu por causa de seu corpo. “Se me chamassem de gorda há 20 anos, eu chorava. Hoje, não mais”, afirmou. A artista explicou que aprendeu a filtrar as críticas, ouvindo apenas as opiniões de quem realmente a ama.
Essa postura se repetiu em seus shows. Em uma apresentação em 2012, ela interrompeu a música para confrontar um homem da plateia que ofendia uma mulher LGBTQIA+. “Não admito preconceito nem na minha vida nem no meu palco”, disse, sob aplausos.
Bissexualidade assumida e engajamento real
Preta sempre foi transparente sobre sua sexualidade. Ao se declarar bissexual, ela ajudou a ampliar o debate sobre a diversidade sexual no Brasil. Participou de campanhas contra a homofobia e esteve presente em atos públicos em defesa da comunidade LGBTQIA+.
Sua trajetória é marcada por coragem, irreverência e coerência. Além de cantora e atriz, ela se tornou símbolo de resistência e inclusão: mulher negra, bissexual, de corpo fora dos padrões tradicionais, empresária e ativista. Sua vida é uma mensagem poderosa para milhões de pessoas que se sentem marginalizadas por não se enquadrarem nas expectativas sociais.
Justiça e representatividade: o que fica da decisão
A confirmação da condenação de Bolsonaro é, antes de tudo, um recado importante: ninguém está acima da lei. A decisão do Tribunal de Justiça reafirma que o discurso de ódio e o preconceito não devem ser normalizados, especialmente quando partem de figuras públicas com grande alcance.
Ao mesmo tempo, o caso reforça a importância de figuras como Preta Gil, que usam sua visibilidade para lutar por igualdade, respeito e inclusão. Sua voz continua ecoando, inspirando e abrindo caminhos para outras pessoas que também enfrentam discriminação diariamente.